O poeta José Ilídio Torres havia organizado com os poetas que publicaram na Alef um lançamento da revista em Ponte de Lima, uma Vila, dito por ele como “mágica”. Para chegar a ela o caminho é a auto-estrada A1 Norte partindo de Lisboa que segue pelo interior de Portugal passando por algumas das principais cidades do país como Coimbra, Aveiro, Porto e monumentos históricos e tradicionais como a cidade de Fátima, ou o Castelo de Tomar. Depois de quatro horas de viagem quase na fronteira da Espanha chega-se a Ponte de Lima.
Imediatamente começa a aparecer a magia da Vila.
Igreja Matriz
Ponte de Lima é a Vila mais antiga de Portugal, tem
mais de 800 anos, a igreja Matriz é de 1400. Surpreende a beleza e a
integridade das construções bem como a paz que emana do pequeno lugar.
É uma sensação estranha que o tempo não parece importar e
que o rio Lima que corre perpendicular a Vila teve sua ponte construída
pelos romanos e parece contrariar a ideia de Heráclito que é impossível
banhar-se nas mesmas águas duas vezes.
A razão do que afirmo é baseada numa lenda local. Os romanos chamavam a esse rio que cruza a
aldeia de Rio Lates, (o rio do esquecimento, que nos faz esquecer a cada
renascimento quem fomos na vida anterior, Gustavo Doré ilustra na Divina
Comédia, Dante atravessando o Lates). Se dermos a razão da lenda criada nesta
cidade pelos romanos é possível, sim, banhar-se nas mesmas águas do Lates
diversas vezes, desde que consideramos serem possíveis os renascimentos.
E conta a lenda local, representada nas margens do Rio
Lima, que um batalhão de soldados está paralisado pelo medo que se recusam a
atravessar o rio com receio de perder a memória. O comandante é único a atravessar o rio e ao chegar no outro
lado prova a eles que não a perdeu chamando, um a um, pelo nome.
E a memória não perdida dessa cidade está colocada em
cada parede, viela, janela, porta, no rosto dos moradores e nos pequenos
negócios. Foi nela que os monges de Francisco de Assis criaram seu primeiro
mosteiro em Portugal e, é passagem do caminho para os peregrinos de Santiago de
Compostela.
Aos poucos a magia da pequena Vila vai nos separando da
velocidade, da imprecisão, das incoerências aparentes do mundo e nos põe
em suas águas e nos mostra uma vida de solidez e paz que já foi reconhecida pelos
reis de Portugal, os monges de Francisco e os peregrinos que nela transitam.
E noite chega e encontramos os poetas José Ilídio Torres, Maria Alexandra Cruz Mendes, Antonio
Paiva e Flávio Lopes da Silva. Nenhum deles reside na Vila e vieram de diversos lugares de Portugal para nos
encontrar e participar do sarau e lançamento da revista Alef organizado por
Jose Ilídio no bar, o Arte e Baco.
Arte e Baco em Ponte de Lima
Mas antes disso eles nos convidam para jantar
no restaurante Vaca das Cordas ( título de uma tradição que remonta aos
celtas, primeiros habitantes da região. É uma festa, e entre as atrações está um
touro ( no início era uma vaca amarrada, mas ela não assustava ninguém trocaram
por um touro) persegue a multidão.
O Vaca das Cordas fica em uma das vielas. As mesas
estão na calçada, a primavera portuguesa nos premia com um fim de tarde pleno
com o sol refletindo no rio. A penumbra da noite aumenta e os poetas
começam a falar das tradições do local, de seu amor por Portugal, de sua
admiração pelo Brasil, de suas
preocupações com o futuro da Europa, quando chega a mesa um prato
especial do restaurante, um indescritível bacalhau, acompanhado do vinho verde
da região ( verde que também pode ser tinto, é verde no tempo de maturação,explicam).
Maria Alexandra Cruz Mendes, lê seus poemas publicados na Alef
E noite continua perfeita quando seguimos para sarau.
Enfrentamos o bar Baco e Arte lotado, uma platéia atenta e o sotaque
diferente começa a ecoar pelas paredes antigas do Baco com poemas ditos na voz
de José Ilídio Torres, Maria Alexandra Cruz Mendes, Antonio
Paiva e Flavio Lopes da Silva e Ana Laura. Alguém puxa também poemas de Pessoa
e de outros poetas portugueses que não conhecemos, mas prometemos
descobrir.
Quando o cansaço nos derruba vamos para o melhor quarto
de hotel que encontramos em toda a nossa viagem: No primeiro andar da Mercearia
da Vila, quase na frente do Mosteiro dos Franciscanos. Um lugar de sonhos abençoados.
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